18 de dezembro de 2011

À Patricia

Olhar para ti era como olhar por uma janela. Havia muito do movimento do ar em brisa e muito do aroma da manhã. Aquele misto de optimismo e resignação em que decidimos se vamos ou ficamos. Se a cama nos prende ou nos solta.
Todos os dias me perguntavas com o só-teu sorriso
-O que deseja
e eu, após a tua partida, dizia a quem me acompanhava
-Esta miúda é simpática
sem receber qualquer resposta porque na realidade nem parecias assim tanto.
Mas como estava a dizer, tinhas a rara característica nas pessoas que é tão típica das janelas que é dar-nos brisa perfumada. Tinhas também algo de porta porque parecia que após a nossa despedida o dia corria melhor, como acontece sempre com as portas que temos gosto em abrir. A porta de casa. Do carro. Do quarto de alguém íntimo. Todas aquelas portas que sabemos ser o derradeiro obstáculo antes de algo que nos vai fazer bem. Numa palavra: Luz. As portas trazem luz.
Assim sendo, nota bem, transportavas o vento limonado em brisa enquanto cá andavas e davas-me um melhor dia à despedida. Eras uma janela e uma porta em mim. Era como se de repente a minha vida tivesse uma nova varanda.
Faltou-me sempre a coragem de te dizer que podias deixar de me tratar por você e que o ar que encaracolavas à tua volta ficava suspenso a troçar comigo mesmo à minha frente como se fosse um daqueles cabelos finíssimos que param mesmo à frente dos nossos olhos e não conseguimos agarrar nem que disso dependa a nossa liberdade.
Agora já não trabalhas lá e as tuas colegas transportam o ar como as redes transportam peixe.
Perguntam-me
-O que vai ser
ou
-Que posso trazer
e não trazem nada com elas. Nem uma pequena luz que se abrigasse numa colher prateada.
Pelo bem que trouxeste, pelo ar rico em oxigénio e limão, pela luz matricial à despedida desejo-te uma casa inteira. Feliz e cheia de aromas, como parecias tu antes de me deixares aqui, sozinho, a fumar na varanda.

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