5 de fevereiro de 2012

Pigmento

Dizem por vezes relativamente a Cesário Verde que este foi o primeiro escritor-pintor de Portugal pela forma como inseria ricos mundos pictóricos nos seus poemas. Várias vezes senti as mesmas dores que ele, ignorado pelas intrépidas moças para as quais, à altura, eu não estava à altura.
Mas até Cesário, cálculo, teria dificuldade em encontrar na sua paleta palavras para descrever certas cores e foi disso que me lembrei quando me disseste nessa tua língua complicada de entender que os teus olhos tinham uma cor
-Indefinível
com essa mesma palavra, usada inocentemente e de forma espontânea, tentaste-me pintar uma aguarela que respondesse à minha pergunta
-Afinal de que cor são os teus olhos
dita naquela língua que é tua e da qual só sei uma quantidade limitada de frases.
De facto indefiníveis eles eram e assim ficaram sem que eu me preocupasse muito com isso porque o melhor que nos acontece fica nesse intermédio das coisas mágicas que acontecem sem explicação, imagem ou palavra. Entre nós houve e haverá daquela poesia que não se guarda numa folha, o teu cheiro não cabe em nenhum frasco, o sabor do teu beijo não existe em nenhum condimento de nenhum mercado bairrista de nenhuma cidade do Mundo.
Dizem que aguarela é uma das técnicas de pintura mais difíceis de dominar. Tenho então tempo para aprender a pintar com a água tingida até que um dia vou descobrir que cores tenho de misturar para chegar ao tom dos teus olhos e aí parto à aventura de descobrir novos tesouros teus sobre os quais me debruçar.

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