12 de fevereiro de 2012

A nossa praia

Havia uma praia abandonada naquele sítio e naquela altura. Às vezes, diziam, até a água se ausentava e enrolava noutras areias, colorindo de espuma outras rochas. Mas nessa praia, orfã de gente, estávamos nós a dar-lhe calor e pés que a marcavam e lá ficavam até ao eventual regresso da maré. Os nossos pés, dizia-te eu, contavam a história de estarmos juntos porque as pegadas misturavam-se e liquefaziam a areia como naqueles diagramas com solas, setas e números que ensinam a dançar Tango e Cha Cha Cha.
Cumprimos a promessa de dançar à hora das primeiras luzes da manhã. Se houvessem galos eles cantariam, tenho a certeza, mas à falta deles surgiram umas tantas gaivotas e periquitos-de-colar que antes do sol já coloriam os ares. Àquela hora, também nós fomos o primeiro sol, dançando próximos como duas estrelas que no encontro orbitam e que numa chuva amena se beijam ao som de nenhuma música.
Na realidade não estávamos na praia, não havia gaivotas nem periquitos-de-colar. Estávamos num passeio de uma rua qualquer a ouvir a rouca música dos poucos carros que passavam mas, ainda assim, o dia nasceu à hora da nossa dança e os lábios só se separaram para dizer, apontando
-Look, there's the sun
sem tirar os olhos dos teus.
É que o sol tem a graça de não nascer só nos montes e naquela estrada sem areia nem mar ele atirou umas dúzias de raios que inventaram um par de pássaros dos quais não sei o nome. O par de pássaros, que se note e não obstante a liberdade, não somos nós. São mesmo pássaros, asas, bico e música. Despiste-me de poesia porque agora anda por aqui uma ausência tua que nunca me abandona.
Após a dança não sonhei com mar e praia. Após a dança atingiu-me que como eu e tu, as estrelas, não havia mais ninguém no nosso planeta porque, àquela hora, só ali o sol nascia dançando e os sonhos, esses, são mais saborosos de olhos abertos.

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