16 de março de 2014

Sapatos rubros

Ando a ler mais sabes? Acho que só se consegue preencher de palavras úteis e belas um vocabulário se as inventariarmos através da leitura. E para ti quero mais palavras. 
Naquele dia em que as tuas pernas pararam de dançar e se sentaram pacíficas na mesma mesa que as minhas, no banco tão ao meu lado que por vezes as tuas pernas e as minhas até se tocavam, percebi que não tinha tantas palavras para te oferecer quantas tu me davas a mim e quantas merecias. Restou-me o olhar e uns tantos toques fugidios para comunicar o quanto o teu perfume me assolou de tudo que era calma. Se as tuas pernas não estivessem ali paradas, tão serenas e desistentes, logo te puxaria para as pôr de novo em movimento, na hipnose do ritmo, no tempo da nossa batida unissona que em linha recta nos poderia até levar dali para fora.
Apetece-me dissolver as tuas pernas num copo de água e bebê-las. Apetece-me pô-las a desfilar para mim, na minha direcção, infinitamente até que as viesses demolir e apaziguar ao meu lado, num banco justo ao meu ou no meu colo, na minha cama. Para essas pernas, percebo agora, as palavras são curtas.
Para as tuas pernas, se são elas que trazem o teu sorriso e a tua alvura perfumada, construo uma estrada acolchoada, uma via verde para os meus braços, um par de sapatos fáceis de tirar. Podes vir quando quiseres, traz tudo o que é teu e não deixes as pernas à porta, eu e elas temos conversa para pôr em dia.

Sem comentários:

Enviar um comentário