1 de novembro de 2009

Três em cinco

Futebol. Em campo quatro cheerleaders, nos momentos que antecedem o jogo esperado, a fazer publicidade a uma marca qualquer. Urros e assobios. Sintomas da finda tradição masculina do futebol, um rasgo de liberdade num local que, felizmente, se democratizou e embelezou com aquelas que dantes ficavam em casa ou no carro a tricotar.
Ao meu lado um senhor mais velho, companheiro de lugar já há uns anos e de quem, ainda assim, nada sei além do nome, que gosta de casacos de couro e aperta com força a mão ao chegar, exclama desalentado
- Só uma delas vale mais do que nós todos juntos
isto dito de forma triste como se de repente descobrisse que estava orfão, tinha falido e a mulher o tinha deixado por isso mesmo.
Eu a pensar na tal fatal frase, porque temos de ser humildes perante pessoas mais velhas, e em que medida ela se aplicaria a mim e à minha experiência de pessoa com idade para ser filho dele.
Descubro que a estatística e a memória não me deixam ficar mal. Três em cinco é a conta. Das cinco mulheres que conheci, três não merecia e, lá está, fiquei orfão, fali e elas perceberam que temos sempre de procurar pessoas que não merecemos e que nos melhorem por comparação e aprendizagem.
Com a primeira aprendi quantos centímetros de pele escondidos as mulheres têm ao tomar banho (não lhe merecia o corpo), com a segunda aprendi que também o cabelo é erógeno e ainda que os olhos podem chorar ao fim de um beijo (não lhe merecia a leveza) e com a terceira aprendi o segredo -que não partilho- da escolha das maçãs verdes mais doces, da importância dos abraços como expressão pura de carinho e amor e ainda como é possível sorrir com o olhar mesmo tendo os olhos fechados (a esta não lhe merecia o corpo, nem a leveza, nem a magia).
Assim vai sendo o tempo, no estádio exultaram mais algum tempo com o corpo das dançarinas que não merecemos enquanto na minha cabeça ainda exultava em solidão, com a memória dos banhos aromáticos, das danças de cabelos embrenhados e dos abraços de corpo inteiro a sorrir de olhos fechados. Assim vai a luta pelo merecimento.

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